ÓTIMOS PREÇOS, AGUARDAMOS SUA VISITA

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quinta-feira, 6 de abril de 2017

VOCÊ NÃO PODE DEIXAR DE VER!!! Pior seca em 73 anos traz fome e faz população dividir água com animais...

Da porta de casa, um cenário desolador. O olhar atento de seu Antônio Ferreira do Sá se perde no horizonte em meio a um sentimento de angústia quando se percebe que o verde que dá vida à natureza a seu redor vai aos poucos desaparecendo, sendo devastado pela seca. De um lado, o solo árido não permite que as plantações vinguem; de outro, animais debilitados por fome e sede se reduzem a carcaças expostas aos urubus. É nesse contexto que o homem do campo de 70 anos, hoje um dos mais de 4,1 milhões afetados pela estiagem prolongada que assola a Bahia há cinco anos, tenta tocar a “vida pra lá de difícil”, como ele mesmo diz.
Morador de um pequeno povoado na zona rural de Feira de Santana, segunda maior cidade do estado (a cerca de 100 quilômetros de Salvador), Antônio precisa de uma pausa longa para puxar na memória se já viveu situação parecida. Mas não se recorda. “Tenho 70 anos e não lembro de seca aqui como essa. Ouvi falar de uma em 1932, quando nem tinha ainda nascido. A daquele tempo, segundo o povo conta, foi pior, porque morreram muito mais bichos e ficava todo mundo quase sem nada. Além disso, naquela época não tinha água da Embasa [Empresa Baiana de Águas e Saneamento] e hoje já tem”.

Seu Antônio mora no distrito de Maria Quitéria, em Feira de Santana (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
O último período de estiagem “brava” de que o agricultor aposentado ouviu falar coincide com a época em que Graciliano Ramos publicava “Vidas secas” (1938), narrativa que se passa no sertão nordestino, marcado pelas chuvas escassas e irregulares, e conta a história do vaqueiro Fabiano, que, de tempos em tempos, era obrigado a se mudar com a família e a cadela Baleia de regiões castigadas pela seca em busca de sobrevivência.
A Feira de Santana de seu Antônio, apesar do apelido de “Princesa do Sertão” dado pelo também escritor Ruy Barbosa por ser a cidade mais importante do interior do estado, fica localizada no agreste baiano, mas a “miséria” e a “desumanização” de que fala Graciliano para descrever os impactos da estiagem no sertão nordestino à época podem muito bem ser aplicadas à realidade atual de moradores do município.
O Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (Inema) atesta que, desde que passou a reunir maior volume de dados meteorológicos, a partir de 1960, não houve estiagem como a vivida hoje. Mas a última seca tão prolongada e perversa como a atual, segundo dados oficiais, ocorreu mesmo antes do nascimento de seu Antônio, só que na década de 40. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, crava que o quadro atual, não só na Bahia como em todo o Nordeste, é o pior em 73 anos – o último período crítico, segundo o órgão, durou três anos, entre 1941 e 1944.
Seu Antônio alimenta com mandacaru os animais em Feira de Santana (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Seu Antônio alimenta com mandacaru os animais em Feira de Santana (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Como reflexo da estiagem, conforme a Superintendência de Proteção e Defesa Civil (Sudec), a Bahia está atualmente com 218 dos seus 417 municípios com situação de emergência decretada – 21 deles com racionamento de água. A situação crítica aflinge pequenas e grandes cidades, como Feira de Santana, Vitória da Conquista, na região sudoeste, e Juazeiro, na região norte.
Ao contrário dos personagens de “Vidas secas”, no entanto, seu Antônio não cogita sair do pedaço de chão em meio ao semiárido onde nasceu e foi criado. Tem esperanças de que, a qualquer momento, uma “chuva boa” caia e mude a realidade. “A última chuva foi em outubro, mas foi pouca coisa. Chuva para trazer água aqui tem que ser de trovoada. Estamos esperando, mas até agora não chegou ainda. Mas daqui para essa semana ela vem. Pelas nuvens você conhece. Tem que vim porque Deus quer que venha. Se não vier, a gente tem que viver de qualquer jeito”, diz.
Um bezerro de seu Antônio morreu (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Um bezerro de seu Antônio morreu (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
No quintal de seu Antônio, somente um cajueiro e alguns mandacarus, plantas mais resistentes à estiagem prolongada, conseguem se manter vivos. Um pé de pinha também ainda resiste com poucas folhas verdes, mas já murchas, e frutos apodrecidos que não servem sequer aos pássaros. “Eu plantava feijão, milho, mandioca, mas parei tem um bocado de tempo. Tá difícil”, afirma.
“Aqui, tenho aquela vaca ali, que é cismada, o bezerro e cinco cabeças de ovelhas. E tem essas galinhas também, mas são de um irmão. Um bezerro que era meu morreu na semana passada. Estava doente. Cerrou a boca e não estava querendo comer nada. Para os que restaram, a gente dá farelo de milho, cevada, mandacaru, pindoba. Tem que comprar ração, mas é caro. Se fosse achado de graça seria bom. Para beber, dou água da Embasa [empresa estadual de abastecimento de água], a mesma que bebo. A fonte que tinha [onde os bichos bebiam] secou essa semana”, diz. O idoso também armazena no quintal dezenas de garrafas pet com água para dar aos bichos, caso a encanada pare de chegar. “Tem umas 70 [garrafas]. Nunca se sabe, não é?”.
Zona rural de Feira de Santana, na Bahia, sofre com estiagem prolongada (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Zona rural de Feira de Santana, na Bahia, sofre com estiagem prolongada (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
O rastro da seca começa a ser percebido logo quando se sai do centro da cidade e se pega uma estrada de terra que leva até o povoado de Barrocas, no distrito de Maria Quitéria, onde moram Antônio e outras cerca de 200 pessoas. Em toda a zona rural de Feira de Santana, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), vivem 64 mil dos cerca de 618 mil habitantes do município. De carro, o trajeto pode ser feito em cerca de 40 minutos. No percurso, é possível observar vegetação e aguadas secas, além de animais mortos.
De longe, também se avista uma poeira branca envolvendo uma carroça, que, diariamente, sobe e desce as ladeiras do povoado. Guiando o cavalo que puxa o veículo está Avelino Barbosa da Silva, de 51 anos. “Carrego palma para dar para as ovelhas, carrego água. Não tenho horário para começar a trabalhar, não. A hora que eu acordo eu estou trabalhando. Acordo umas 3h30 a 4h da madrugada, começo a trabalhar e só paro por volta das 17h”, conta.
Avelino Barbosa da Silva trabalha com uma carroça em Feira de Santana (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Avelino Barbosa da Silva trabalha com uma carroça em Feira de Santana (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Vizinho de seu Antônio, Avelino diz que faz inúmeras viagens por dia para tentar ganhar dinheiro, manter os animais vivos e ter o que comer. “Eu pego coisas para os animais comerem. Levo para a minha roça e também faço o trabalho para os outros. Eu vivo disso aqui, do trabalho que eu faço. Mas a seca afeta o dia-a-dia como um todo, principalmente os bichinhos que ficam sofrendo no sol quente e na seca. O que ameniza um pouco é a água da Embasa, que aqui cai cinco dias e passa 15 dias ou um mês sem cair. Da idade que eu estou, eu nunca vi uma seca como a desse ano aqui. Essa foi das piores que teve. Só Deus agora para ajudar”, diz, antes de seguir viagem, apressado, debaixo do sol escaldante.
A Embasa informou que estão sendo testadas intervenções para regularizar e ampliar o abastecimento de água fornecida à localidade. Segundo a empresa, uma das medidas a serem adotadas será a duplicação de 16 km de adutora para parte da zona rural da cidade (distritos de Tiquaruçu, Matinha e Maria Quitéria) e para os municípios de Santa Bárbara, Tanquinho e Santanópolis, que, assim, como Feira de Santana, estão com situação de emergência decretada pela estiagem. A obra, conforme a Embasa, está prestes a ser licitada, com investimento de R$ 4,7 milhões.

Ademário dá farelo de milho e água em um tonel a seu cavalo "Chocolate" (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Ademário dá farelo de milho e água em um tonel a seu cavalo ‘Chocolate’. (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Poucos passos à frente, seguindo o trajeto pela zona rural de Feira, o também agricultor Ademário de Jesus, 48 anos, dá farelo de milho e água em um tonel a seu cavalo, “Chocolate”, na beira de estrada. A alimentação é para que o animal aguente mais um dia. Viaja puxando uma carroça por cerca 1,5 km por dia com o dono em busca de trabalho e água em tanques que ainda resistem à seca.
“Ontem, estava limpando tanque, mas hoje a gente não foi porque trabalho tá difícil. Com uma seca dessa aí, quem tem condição de pagar a gente? Eles [os fazendeiros] dizem que não têm dinheiro. O negócio parou e a gente não acha nada, nem na roça e nem na cidade”, afirma, enquanto mostra, entristecido, áreas que seriam de plantio completamente secas.
A maioria dos moradores ali pratica a agricultura de subsistência, que tem como principal objetivo a produção de alimentos para suprir as necessidades das próprias famílias rurais – quando o tempo é bom, muitos ainda ganham dinheiro vendendo a produção para o mercado interno. Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Feira de Santana, José Ferreira Sales, o município possui mais de 20 mil agricultores, que têm na chuva a única esperança por dias melhores. Quando ela não vem, não só a sede como a fome bate à porta.
Zona rural de Feira de Santana sofre com estiagem prolongada (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Zona rural de Feira de Santana sofre com estiagem prolongada (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Nesse ano, não adiantaram sequer os pedidos de chuva dos moradores feitos à São José, santo padroeiro da região que na crença cristã foi o esposo da Virgem Maria e o pai adotivo de Jesus. A tradição de plantar durante o mês de março, em que se comemora o dia do santo, para colher no São João, em junho, é centenária. Por isso, anualmente, os agricultores preparam a terra, compram sementes e aguardam ansiosos a chuva cair desde o final de cada ano.
Com os planos frustrados, um clima de tensão toma conta dos agricultores. De acordo com a Estação Climatológica da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), choveu muito pouco nos dois últimos meses no município: somente 5 milímetros, enquanto eram esperados 50 milímetros. E também não há previsão de chuva forte durante o outono. Desde 2011, a prefeitura publica, seguidamente, decretos de situação de emergência. O último, em vigor atualmente, foi em agosto de 2016.
A gente já percebe as pessoas sofrendo com a falta de água e passando dificuldade de alimentação. Hoje, não dá nem para identificar qual a área mais afetada. Todos os distritos sofrem por igual”
José Ferreira Sales, presidente do Sindicato dos Tabalhadores Rurais
O Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) diz que a redução das chuvas já vem sendo observada desde 2010 na Bahia, mas foi a partir de 2012 que a situação se agravou.
Desde o ano passado, apenas em janeiro de 2016 foram observados volumes de chuvas acima da média. A partir de então, o predomínio foi de precipitações abaixo do esperado em todas as regiões.
No período entre fevereiro de 2016 e janeiro de 2017, as chuvas no Recôncavo baiano ficaram entre 40% e 60% abaixo da média. Já no semiárido, como em algumas localidades do médio São Francisco, o déficit chegou aos 80%.
“A seca afeta muito a vida. Esse ano, até plantei milho, feijão, batata, aipim. Tudo morreu. Com o sol desse jeito, eu estou vendo que só Deus mesmo para mandar um milagre para que a gente possa plantar. Não podemos fazer nada, só esperar”, diz Ademário.
A água ‘verde’
Não muito longe dali, no povoado de Santa Bárbara, distrito de Bonfim de Feira, vive a lavradora Bernadete Nascimento Nery, 46 anos. Solteira, ela mora numa casa simples com os cinco filhos, de 5, 10, 14, 17 e 20 anos. Durante cerca de seis meses, enquanto o reservatório de água de mais de 10 mil litros que tem no terreiro de casa esteve seco, a família foi obrigada a consumir uma água suja, de cor esverdeada, de um tanque localizado a cerca de 300 metros da residência.

Três dias antes de a equipe do G1 visitar a localidade, um carro-pipa tinha passado por lá, depois de cerca de quatro meses sem aparecer, segundo moradores, e abastecido a cisterna de Bernadete, que nunca teve rede de água encanada. Foi, então, que ela suspendeu o consumo da água verde. No entanto, teima em deixar na geladeira uma jarra da água barrenta do tanque por medo de o carro-pipa não voltar.
Bernadete passou seis meses tomando água verde antes de chegada do carro-pipa (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Bernadete passou seis meses tomando água verde antes de chegada do carro-pipa (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
“Eu passei seis meses tomando essa água. Tem gosto de pé de animal. A gente ia lá [no tanque], pegava, coava num pano de prato, fervia no fogão de gás para matar os micróbios e colocava na geladeira. Dava para beber. Não tinha outro jeito. A gente ia viver como? Com sede era que a gente não podia ficar, não é? E também dava para cozinhar, lavar, dar banho nas crianças. Por não ser uma água tratada, medo eu tinha de beber. Sempre a gente tem diarreia e descobri um pequeno caroço no fígado, um nódulo, mas não sei se foi por causa da água. Agora, graças a Deus, esse carro-pipa passou e amenizou a situação da gente depois de tanto a gente pedir para a prefeitura”, destacou. Feliz, ela mostra a diferença da coloração da água suja do tanque que bebia e da “boa” que tinha acabado de chegar.
A presidente da associação comunitária de Santa Bárbara, Geisa da Conceição dos Santos, diz que praticamente todos os moradores da região vivem situação parecida com a de Bernadete. “Quando a seca vem desse jeito, fica péssimo. Muitos que viviam da agricultura, trabalhando nas fazendas, da destoca, da fazeção de cerca, hoje não tem esse tipo de trabalho porque os fazendeiros também não têm como fazer esse tipo de serviço. Sobre o abastecimento, como não chega água em todas as torneiras, fizemos o pedido de alguns carros-pipa para as famílias e já começamos a ser atendidos. Eu espero que continue assim, que não pare somente por aqui”, destaca.
Bernadete tinha que andar 300 metros com balde na cabeça para levar água para casa (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Bernadete tinha que andar 300 metros com balde na cabeça para levar água para casa (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
A prefeitura de Feira de Santana informou que montou uma força-tarefa para abastecer com água potável áreas da zona rural não cobertas pela rede de abastecimento regular. A administração municipal disse que mantém, com a Defesa Civil, 12 caminhões-pipa em operação e que conta com o apoio do Exército. Diariamente, segundo a prefeitura, os veículos levam entre 30 mil litros a 40 mil litros de água aos moradores. No povoado de Bonfim de Feira, a prefeitura informou que a oferta é ainda maior e que, desde meados de março, os moradores passaram a receber 72 mil litros por dia. A administração municipal disse que a comunidade recebe, diariamente, dois caminhões abastecidos com 18 mil litros de água e que cada um faz duas viagens por dia.
“Essa comunidade possui água encanada em quase toda sua extensão. Mas por algum problema na empresa prestadora de serviço, o abastecimento foi interrompido. Por conta disso saímos de nossa rotina de abastecimento em outros distritos e vamos reforçar nessa região. Temos também o apoio da Defesa Civil nessa situação”, afirmou o secretário de Agricultura, Joedilson Machado, por meio de nota. Ele disse, ainda, que o abastecimento obedece a ordem de pedidos que chegarem à secretaria.
Bernadete mostra diferença entre coloração de água barrenta e água 'boa (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Bernadete mostra diferença entre coloração de água barrenta e de água ‘boa’ trazida por carro-pipa. (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
A Embasa informou que a distribuição de água para o distrito de Bonfim de Feira acontece, atualmente, de forma alternada com outras localidades da região. A empresa ainda destacou que inaugurou, no dia 17 de março, a obra de ampliação do sistema integrado de Santo Estevão, que abastece Bonfim de Feira e outras localidades de Feira e municípios vizinhos, e espera que o fornecimento passe a ocorrer com maior regularidade.
Com relação à situação de Bernadete e de outros moradores que vivem sem água encanada, a Embasa disse que o serviço de abastecimento que presta é voltado principalmente para centros urbanos que apresentem viabilidade técnica para atendimento com rede distribuidora e que, em localidades rurais com menor viabilidade, o abastecimento fica sob a responsabilidade da prefeitura municipal, por meio de carros-pipa.
Zona rural de Feira de Santana, na Bahia, sofre com estiagem prolongada (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Zona rural de Feira de Santana, na Bahia, sofre com estiagem prolongada (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Como também não conseguiu manter a rotina de anos anteriores e plantar feijão, mandioca, aipim e batata no quintal de casa, Bernadete faz questão de abrir a porta da geladeira para mostrar que “está sem nada”. Mantém em refrigeração, além da água de beber, somente dois ovos, algumas beterrabas, uma lata de óleo, um tomate, metade de um frango que comprou fiado em um supermercado. No dia da visita do G1, o almoço tinha sido arroz com frango.
Por mês, diz ter como única renda R$ 163 do Bolsa Família, programa do governo federal voltado para famílias em situação de pobreza. Nenhum dos filhos trabalha.

Bernadete conta que, como muitos vizinhos, desistiu de criar animais. No quintal, só é possível contar umas poucas galinhas e dois cães de estimação.
“Tinha um porco, mas não estou criando mais. Vendi. Meus vizinhos que criam gado estão dando mandacaru. Ração eles não têm dinheiro para comprar. Vão morrer tudo os bichos. As galinhas não botam mais porque não tem milho para comer. Aonde vai achar? A gente não tem dinheiro para comprar. A água que elas [as galinhas] bebem sou eu que dou dessa que chegou do carro-pipa. Divido minha água com elas. Vou deixar elas morrerem de sede? Não pode”.
A filha mais velha, de 20 anos, está prestes a concluir o ensino médio, e Bernadete, que estudou apenas até a sexta série, espera que ela consiga logo um emprego na cidade grande para ajudar nas despesas de casa. Tem esperanças, ainda, que, posteriormente, os demais filhos tomem o mesmo rumo.
Animais não encontram comida em pastos secos (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Animais não encontram comida em pastos secos (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
A prefeitura de Feira de Santana disse que o decreto de emergência publicado pelo município foi homologado pelo governo do estado no dia 15 de março e que aguarda que a União também faça o reconhecimento. Com isso, segundo a administração municipal, será possível ampliar o acesso ao benefício Garantia Safra, uma espécie de seguro, no valor de R$ 850, voltado a agricultores sujeitos a perda de safra por estiagem ou excesso hídrico.
Os pagamentos do benefício referentes a 2016 aos agricultores inscritos no programa deverão ser efetivados até abril, segundo a prefeitura. A administração também informou que, com o reconhecimento da situação de emergência, será possível realizar compra de milho a preços menores dos estoques do governo federal, realizar empréstimos rurais, além de viabilizar frentes de trabalho e entrega de cestas básicas.
Animais não resistem à seca e morrem na zona rural de Feira de Santana (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Animais não resistem à seca e morrem na zona rural de Feira de Santana (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Esperança
O casal de lavradores Maria Silvana Barbosa da Silva e Nestor da Conceição da Silva, ambos com 57 e pais de 11 filhos, a maioria deles agricultores, também espera um “milagre” cair do céu para que as plantações vinguem na terra como em datas passadas. Costumam plantar feijão, milho, abóbora, batata e aipim, para consumo próprio, e também fumo para vender na roça e na cidade grande.

“A gente nunca plantou para não ter nada e esse ano não teve nada. Chuva já no ano passado não teve. Nós plantamos 40 litros de feijão e o que pegou foram os mesmos 40 litros que plantou, sem nenhum litro a mais. E milho não teve nada”, lamenta Maria, que é aposentada.
Casal de lavradores Maria Silvana Barbosa da Silva e Nestor da Conceição da Silva (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Casal de lavradores Maria Silvana Barbosa da Silva e Nestor da Conceição da Silva (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Enquanto ouve os lamentos da esposa, o marido mantém-se otimista do lado. “O sol não deixou ter nada e, agora, estamos comprando o que comer: feijão, farinha, arroz. Mas ela [a chuva] ainda vai vim, não é? A gente espera que ela venha, porque não pode ficar sem chover. Com chuva, já temos um adianto porque já rende mais a comida na mesa. Não é possível que ela não caia. Os pastos estão todos puros, só está a terra e os pedacinhos de mato. Sem a chuva, a gente não presta para nada. Tenho certeza que vai cair a qualquer momento”, diz, enquanto ergue a cabeça e aponta os olhos para as poucas nuvens no céu.
Para o céu, ansioso, também olha o agricultor Antônio Nascimento, 60 anos. Sempre alegre, ele é a prova viva de que, se por um lado a seca tem o poder devastar a natureza, por outro não é capaz de destruir a esperança e tirar o sorriso do rosto de muita gente. Debaixo de um grande chapéu de palha, que ameniza um pouco os efeitos do sol, lembra com saudade de dez anos atrás, época dos “tempos bons”, em que “tudo vingaVa”, quando chegou a colher um aipim de quase dois metros de cumprimento. “Foi a sensação da região”, brinca.
Agricultor Antônio Nascimento, de 60 anos (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
Agricultor Antônio Nascimento, de 60 anos (Foto: Alan Tiago Alves/G1)
“Tinha muita fruta naquele tempo. Já deu aipim, bastante pinha, goiaba. A época estava boa, estava chovendo bastante. Tinha alimento para dentro de casa e também para os bichos, para as galinhas, porcos. Foi quando colhi esse aipim. Tinha um metro e oitenta. Os vizinhos nem acreditavam. Veio até o pessoal da reportagem aqui filmar para colocar na televisão. Botei [o aipim] de molho para fazer puba, porque era grande demais. Não dava para comer, não. Eu cortei, coloquei de molho, fiz a puba e dei para os vizinhos”, recorda.
Nascimento observa os pés de laranja ainda vivos no quintal, mas que já não mais dão frutos, e não esconde a preocupação. O homem do campo, no entanto, tem certeza que os tempos áureos retornarão a qualquer momento”no lombo” da tão esperada chuva de trovoada. “Qualquer chuva que dá, eu estou plantando, pra comer em casa mesmo. Mas aí vem o sol e acaba com tudo. A seca afeta muitas coisas: a comidinha, as frutas. Tudo acaba. Vivo da ajuda do pessoal, da minha família. Agora mesmo não tenho nada. Mas apesar da situação, eu não choro, não. Se chorar, é pior. Dou risada e as pessoas falam que tenho natureza boa. Dizem que parece que mamo em onça e tiro leite em veado correndo. Digo que não sei viver triste, não. Tem que sorrir. Quanto mais a gente sorrir, mais Deus nos dá alegria”, ensina.

FONTE: http://oumarizalense.com.br

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